quinta-feira, 28 de abril de 2011

Mensagem do Bispo Eleito de Coimbra à Diocese

Mensagem do Bispo Eleito de Coimbra
SAUDAÇÃO AO POVO DE DEUS DA DIOCESE DE COIMBRA

Santo Padre Bento XVI acaba de me nomear bispo de Coimbra. A Sua Santidade o Papa asseguro a comunhão no ministério e a cooperação fiel em ordem à construção da Igreja de Jesus Cristo, de cuja unidade é o sinal visível, e peço que me confirme na fé católica e apostólica.

Nestas circunstâncias muito especiais, quero dirigir-vos uma saudação fraterna e manifestar a minha plena disponibilidade para ir ao vosso encontro na realização da missão que a Igreja de Deus me confia.

Nesta saudação incluo todos os membros da porção do Povo de Deus, que é a diocese de Coimbra: os presbíteros, diáconos e seminaristas; os religiosos, religiosas e membros de institutos seculares; a grande multidão de leigos de todas as condições.

Dirijo-vos uma palavra especial, a vós, jovens, rapazes e raparigas, cheios de sonhos de uma vida grande e bela, que hoje encontrais tantos obstáculos à vossa realização. Convido-vos a procurar em Cristo, o vosso companheiro de todas as horas, a alegria e a esperança que buscais. Espero encontrar-vos frequentemente e dedicar-vos parte significativa da minha acção pastoral.

Ao senhor D. Albino Cleto e ao senhor D. João Alves envio um forte abraço, sinal da grande admiração pelo testemunho de fé e de amor à Igreja, que têm dado. Reconheço o trabalho que realizaram nos longos anos de ministério e agradeço a amizade que têm manifestado para comigo.

Respeitosamente saúdo as autoridades autárquicas, académicas, civis e militares presentes na área da diocese de Coimbra, augurando a mais frutuosa mútua colaboração. Cumprimento afectuosamente todos os membros das outras Igrejas Cristãs, os que professam outras religiões e todos os homens e mulheres de boa vontade.

Quando penso no convite que a Igreja acaba de me fazer e na aceitação que manifestei, volto sempre às convicções, já remotas, que me fizeram avançar no caminho da vida cristã e da vocação sacerdotal. Recordo que nos anos da juventude me deixei seduzir por Cristo, considerei que Ele era o “tudo” da minha vida e teria em mim o primeiro lugar. Desejei, desde então, estar disponível para servir onde a Igreja precisasse de mim. Procurando ser fiel ao Deus que me amou e que agora me chamou a um novo serviço, consciente das limitações e dificuldades, canto agradecido os seus louvores.

À Igreja de Coimbra une-me uma já longa ligação, desde o tempo em que aí fiz a minha formação teológica, até aos anos mais recentes de docência no Instituto Superior de Estudos Teológicos. Ao olhar para a Igreja que sou chamado a servir, gostaria de vos dizer que, a partir da fé na presença operante do Espírito Santo, vislumbro nela uma imensidão de potencialidades. Temos a graça de viver num tempo de grandes desafios à fé cristã e ao testemunho vivo de todos os membros da Igreja. Vejo diante de nós os desafios da nova evangelização, que nos pedem um novo entusiasmo e um novo fascínio pela pessoa de Jesus Cristo, o Evangelho que acolhemos e anunciamos. Confio no vigor da vossa fé, no vosso amor a Cristo e à sua Igreja; em comunhão uns com os outros e com Deus, podemos dar ao mundo novas sementes de esperança.

Pedi a Deus por mim, para que a minha presença no meio de vós constitua um serviço à fortaleza da vossa fé, um incentivo aos laços de comunhão eclesial.

Aqui, na Capelinha das Aparições, no Santuário de Fátima, confio a Nossa Senhora a vida e o ministério, nesta nova etapa da minha entrega à Igreja. Peço-lhe que interceda por mim e por vós, junto do Deus, Santíssima Trindade, que adoramos.

Santuário de Fátima, 28 de Abril de 2011
P. Virgílio do Nascimento Antunes

terça-feira, 26 de abril de 2011

Homilia de Domingo de Páscoa - 2011

DOMINGO DE PÁSCOA
(24.04.2011)


«Na verdade, ainda não tinham entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dos mortos» (Jo. 20, 9)


Com esta expressão, retirada do final do Evangelho de hoje, nós somos colocados diante do acontecimento inicialmente ininteligível para os discípulos, em toda a sua profundidade e sentido existencial. Só progressivamente eles vão entendendo o significado da ressurreição, particularmente à medida que fazem a experiência do Ressuscitado.
Mas também nós, hoje, podemos permanecer ainda numa atitude semelhante à experiência inicial dos apóstolos: sem compreender o significado profundo da ressurreição de Jesus e as suas implicações na nossa existência humana e cristã. A experiência do túmulo vazio continua a ser tão inquietante, que coloca uns numa compreensão meramente tradicional de tal acontecimento; e a outros conduz a uma negação, prática ou teórica, de tal possibilidade. Não é raro, mesmo entre cristãos, que a compreensão deste acontecimento fundante da fé cristã se esfume no seu significado profundo, quantas vezes confundido com outras perspectivas de afirmação do sentido da vida e do sentido da morte.
Ora, a experiência de Cristo ressuscitado está no centro da nossa fé de cristãos! Como diz o Papa Bento XVI, na sua obra mais recente Jesus de Nazaré - num comentário à expressão da Carta aos Coríntios, «se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e vã também a vossa fé» (1 Cor. 15, 14) - «com estas palavras, São Paulo põe drasticamente em relevo a importância que a fé na ressurreição de Jesus tem para a mensagem cristã no seu conjunto: ela é o seu fundamento» . E, neste sentido, continua ainda o Papa: «a fé cristã fica de pé ou cai com a verdade do testemunho segundo o qual Cristo ressuscitou dos mortos» .
É com esta preocupação que, por breves instantes, consideraremos a nossa sensibilidade humana ou sociológica da ressurreição, para logo depois afirmarmos os fundamentos para a sua compreensão e consequências na vida da Igreja e de cada cristão.


1. Perspectiva humana /sociológica da Ressurreição.


A afirmação da ressurreição de Cristo é um facto que aprendemos na catequese; que assumimos como adquirido, porquanto afirmado por aquele ou aqueles em que quem reconhecíamos autoridade; ou simplesmente porque sentimos necessidade de dar resposta, ainda que por vezes pouco clarividente, aos limites da nossa necessidade humana, particularmente quando nos confrontamos com as «sombras» da vida, como são a doença e a morte. Todavia, não raro, permanecemos numa atitude de infância espiritual, de mera necessidade, ou de permanente questionamento. Não é raro, ainda, encontrarmos cristãos que, perante a dificuldade da fé na ressurreição, a negam como esperança definitiva para a sua vida humana e plenitude do dom que já nos foi oferecido pelo baptismo. É neste contexto que tomamos, também nós, a mesma expressão de São Paulo, na Carta aos Coríntios: «se Cristo não ressuscitou é vã a nossa pregação e vã a nossa fé» (1 Cor. 15, 14). Mas é ainda o apóstolo, de modo determinado, quem contraria tal afirmação, revelando-nos o facto radicalmente novo: «Cristo ressuscitou dos mortos como primícias [o primeiro] dos que morreram» (1 Cor. 15, 20).
E se é certo que vemos ainda como num espelho, e só depois veremos face a face, como afirma São Paulo, a verdade é que o próprio Cristo declarou bem-aventurados os que acreditam sem terem visto (cf. Jo. 20, 29).


2. A Ressurreição como acontecimento fundante.


A ressurreição de Cristo é o fundamento da nossa fé, como afirmámos já. E o Catecismo da Igreja Católica diz-nos que «ser testemunha de Cristo é ser “testemunha da sua ressurreição”» (CIC. 995), numa alusão aos Actos dos Apóstolos.
Mas o que é a ressurreição? Detenhamo-nos no pensamento do Papa Bento XVI e com ele compreendamos o mistério que hoje celebramos. Diz-nos o Papa que «a ressurreição de Jesus foi a evasão para um género de vida totalmente novo, para uma vida já não sujeita à lei do morrer e do transformar-se, mas situada para além disso – uma vida que inaugurou uma nova dimensão de ser homem. Por isso, a ressurreição de Jesus não é um acontecimento singular que possamos menosprezar e que pertença apenas ao passado, mas sim uma espécie de “mutação decisiva” (expressão equívoca, mas usada aqui analogicamente), um salto de qualidade» . Para logo acrescentar: «na ressurreição de Jesus, foi alcançada uma nova possibilidade de ser homem, uma possibilidade que interessa a todos e abre um futuro, um novo género de futuro para os homens» .
Mesmo face à ciência, que não raro tende a negar o facto da ressurreição, o Papa responde com esta admirável clarividência: «naturalmente que não pode haver contradição com aquilo que constitui um claro dado científico. É certo que, nos testemunhos sobre a ressurreição, se fala de algo que não ocorre no mundo da nossa experiência. Fala-se de algo novo que, até então, era único: fala-se de uma nova dimensão da realidade que se manifesta» .
O acontecimento da ressurreição, para além da experiência íntima (a via mística) a que tantos chegaram, provem-nos essencialmente pelo testemunho apostólico. De modo particular os Actos dos Apóstolos e as cartas do Novo Testamento patenteiam-nos este testemunho singular. Mas é ainda o Papa Bento XVI quem nos ajuda a clarificar algumas impressões do encontro dos discípulos com o Ressuscitado, permitindo-nos perceber quem Ele é e qual a natureza desse encontro. Diz-nos o Papa que Jesus não é alguém que voltou à vida biológica normal e que depois teve de morrer novamente; tão pouco é um fantasma (um «espírito»), ou seja, alguém que pertencendo ao mundo dos mortos se manifesta no mundo dos vivos; de igual modo, a experiência do ressuscitado não se confunde com as experiências místicas, marcadas por «uma superação momentânea do âmbito da alma e das suas faculdades de percepção» . «A ressurreição – diz o Papa - é um acontecimento dentro da história, que, todavia, rompe o âmbito da história e a ultrapassa. (…) Sem dúvida, a própria matéria é transformada num novo género de realidade. Agora, o Homem Jesus, precisamente com o seu próprio corpo, pertence totalmente á esfera do divino, do eterno» .
É este mistério que celebramos em Cristo – a Sua ressurreição e a nossa ressurreição n’Ele. Pois, como afirma o Catecismo da Igreja Católica, «Nós cremos e esperamos firmemente que, tal como Cristo ressuscitou verdadeiramente dos mortos e vive para sempre, assim também os justos, depois da morte, viverão para sempre com Cristo ressuscitado, e que Ele os ressuscitará no último dia» (CIC. 989).


3. Viver como Ressuscitados.


Mas a nossa esperança não é apenas para o futuro; é também já para o presente; sabendo que, «regenerados pelo baptismo», fomos tornados membros de Cristo (cf. CIC. 1213). Ora, é aqui que se insere o convite de Paulo, na segunda leitura de hoje: «se ressuscitastes com Cristo, aspirai às coisas do alto, onde Cristo se encontra, sentado à direita de Deus» (Col. 3, 1). Isto não significa a evasão da vida e da história. Significa, isso sim, que sabendo qual a esperança a que estamos chamados, dela vivemos já pela prática da caridade. E é o amor, que nos configura com Cristo ressuscitado, que nos torna seus discípulos e nos faz trilhar o mesmo caminho de vida eterna. Vida essa que será o definitivo para além da história de cada um de nós; que suplanta todo o material e perecível, como bem refere J. H. Newman, com quem queremos terminar: «Ó Cristo ressuscitado! Também nós temos que ressuscitar contigo; Tu escondes-Te à vista dos homens e nós temos que seguir-Te; regressaste para o Pai e temos que procurar que a nossa vida «esteja escondida contigo em Deus»… É obrigação e privilégio de todos os discípulos, Senhor, ser elevados e transfigurados contigo; é privilégio nosso viver no céu com os nossos pensamentos, aspirações, desejos e afectos, ainda que permanecendo na carne… Ensina-nos a «aspirar às coisas do alto» (Col. 3, 1), demonstrando assim que Te pertencemos, que o nosso coração ressuscitou contigo e em ti está escondida a nossa vida».